Este blog faz mal à saúde. Se conhece alguém com influência ou com um martelo de orelhas, mande fechar este blog. Não se admite tamanho atentado à integridade intelectual dos cidadãos. E à integridade física dos llamas chilenos. Nem que José Carlos Malato faça tanta cura de emagrecimento e apareça todo nú em festas gay mais gordo ainda. E não se admite que não haja quem arranje uma cadeira mais larga para o João Gobern se sentar

Monday, April 20, 2009

Dubrovnik é mais bonito que Sintra e dá para andar de T-shirt e calções

Sintra tem palácios e castelos e muralhas e coisas antigas e bonitas. Dubrovnik também. Sintra é património da UNESCO. Dubrovnik também. Sintra é bonita. Dubrovnik também. Em Sintra chove e faz frio. Em Dubrovnik não.

Sintra fica à beira do Atlântico e das suas águas frias e agitadas. Dubrovnik e as suas ilhotas adjacentes encavalitam-se no Adriático e têm águas quentinhas e mais sossegadas que um cadáver durante a autópsia.

À chegada a Dubrovnik somos recebidos com as boas-vindas numa língua que ninguém entende: «Dobrodošli na Hrvatsku». Não podia faltar, obviamente, aquele éssezinho irritante com um chapéu virado ao contrário. O mesmo que usam para pintar no chão antes das escolas primárias, para avisar o condutor para a proximidade de uma «škola». E, surpresa das surpresas, um magnífico slogan em inglês faz-nos saber que a Croácia é «o Mediterrâneo como um dia já foi». Uau, fantástico! Verdadeiramente surpreendente, tendo em conta que a Croácia é banhada pelo mar Adriático! (vá, vá, eu sei, o Adriático é parte do Mar Mediterrâneo, mas, que querem?, deu-me vontade de baralhar as referências… eu nasci na Papua e sempre me disseram que afinal era a Nova Guiné… não que eu alguma vez tivesse conhecido a Antiga Guiné…)

A única palavra relativamente perceptível na língua desta gente é «Torcida». É o nome que tem a claque de apoio do Hajduk Split, clube de futebol quase centenário de uma cidade que fica mais a norte e que tem uma impressionante milícia de apoiantes por estas bandas. Desde 1950 que a Torcida se chama «Torcida», essa palavra genuinamente croata.

Dubrovnik é um sítio tão bonito que dá vontade de meter no bolso e levar para casa. Ou então de convencer o comendador Berardo a dar aqui um saltinho para negociar uma troca: nós ficamos com Dubrovnik, os croatas ficam com Sintra, o Fernando Seara, o hospital Fernando da Fonseca, o Cacém, Massamá, o IC19, o Cabo da Roca e uma série de terreolas com nomes lindíssimos como Abrunheira, Ranholas, Algueirão, Pêro Pinheiro, Arrentela, Rinchoa, Fitares, São Pedro de Penaferrim, São João das Lampas, Magoito e Monte Abraão. Pronto, eu sei, a Arrentela fica no concelho do Seixal, mas, bolas, que mal fazia dar-lhes o Seixal como presente nesta operação de charme? E no fim das contas eles que não se queixem porque ficam claramente a ganhar – toda a gente sonha, um dia, poder viver numa terra que tem uma rotunda do Ramalhão, a Casa do Preto e as queijadas e os travesseiros. E passeios de charretes puxadas por cavalos que fazem muito cocó no chão (para quando uma lei que obrigue os donos dos cavalos a apanhar as bostas que eles fazem no chão? Isso é que era de coragem).

Dubrovnik é um local de gente doida que se veste aos quadradinhos da cabeça aos pés. (Uma questão: quadradinhos vermelhos sobre fundo branco dá quadradinhos vermelhos-e-brancos? Se sim, quais foram pintados primeiro?, os vermelhos sobre o branco ou os brancos sobre o vermelho? Se não, então por que raio se diz que o F.C. Porto equipa às riscas azuis-e-brancas?). Até as crianças, pobres crianças, andam na rua vestidas como o Boavista debotado. Mas é, na verdade, um sítio tão bonito que dá vontade de visitar e nunca mais parar, motivo pelo qual eu ainda aqui estou e não me apetece ir embora. Alguém fez a maldade de contratar uma visita guiada ao centro histórico e eu lá fui, claro, sob a ameaça de ser vendido como escravo para satisfação pessoal dos netos do Slobodan Milošević.

«O centro histórico» – começou por explicar a senhora, com o seu magnífico sotaque de quem esteve pelo menos três vezes em Alfeizerão, debaixo de um reluzente bigode arranjadinho, enquanto apontava para uma planta da cidade – «foi uma das partes de Dubrovnik mais fustigada pela artilharia durante a guerra». Qual guerra? Mas como é que alguém, algum dia, se lembrou de fazer guerras num sítio como este, onde só apetece mergulhar no mar e nadar sem parar até conhecer, uma-por-uma, todas as ilhas do istmo? Pelos vistos houve quem se tivesse lembrado e não foram poucos.

Aparentemente houve aqui uma guerra no início dos anos 90. Não sei como, escapou-me. Não dei por ela. Se calhar porque na altura eu estava a viver como um ermita juntamente com os pandas neo-zelandeses numa gruta das florestas de Hamilton e, como tal, não havia televisão. Mas houve aqui guerra. Dubrovnik forma uma península que é, no fundo, um enclave entre a Bósnia Herzegovina e o Montenegro (que fica do lado de lá de uns montes que são bem branquinhos, mas tudo bem). Como na altura toda a gente queria ser independente da federação jugoslava (incluindo os próprios sérvios, se bem que nunca admitiram), a Sérvia, dirigida por essa simpática e bondosa figura de seu nome Slobodan Milošević, pediu aos amiguinhos montenegrinos, chefiados pelo Momir Bulatović, que avisassem os habitantes de Dubrovnik para tirar o cavalinho da chuva, porque a cidade é um ponto de comércio demasiado importante para fugir às mãos dos gananciosos. Como os croatas lhes fizeram um manguito que deixaria orgulhoso o Jesualdo Ferreira, vai daí os sérvios mandaram o exército popular da Jugoslávia (sérvio, basicamente) disparar contra tudo o que mexesse.

Os sérvios, gente perfeitamente plural e justa, com um profundo conhecimento de estratégia militar, escolheram minuciosamente os seus alvos: centenas de obuses atingiram as muralhas da cidade, que, sendo medieval e bem construída, resistiu a tudo; um barco de pesca atracado na marina ficou feito em cacos, atingido por quatro projécteis de artilharia marítima, certamente porque os anzóis e as redes que tinha a bordo eram perigosíssimo material bélico; um MIG-21 sobrevoou dois pares de vezes uma irrequieta cruz de pedra situada no topo das montanhas adjacentes… e de todas as vezes que disparou, falhou rotundamente, de modo que o ostensivo símbolo católico lá continua a servir de provocação; o topo do edifício que hoje serve de hotel Hilton Imperial foi atingido e incendiado, uma decisão extremamente inteligente tendo em conta que, nessa altura, o prédio estava em reconstrução e não havia lá ninguém.

Nem tudo foi assim, perfeitamente ridículo. Infelizmente, houve coisas mais sérias e uns quantos civis foram mortos, se bem que nessa altura era difícil usar a palavra «civil», porque basicamente todos os habitantes de Dubrovnik, das senhoras da lota aos residentes do centro de dia, empunhavam uma AK-47 para repelir o opressor.

Mas há que dar um abraço de solidariedade a esta gente de Dubronvik, sabem? Resistem a tudo. Nem sequer havia um exército na cidade, e no entanto repeliram o inimigo. No século XVII resistiram ao Napoleão e às três mil balas de canhão que foram disparadas contra a cidade. Em 1667 houve um terramoto, mas resistiu toda a gente com excepção dos cinco mil que morreram. E, mais incrível que isto tudo, em 1545 a cidade resistiu, com enorme coragem e determinação, ao calvário de ter que acolher centenas e centenas de judeus refugiados de Portugal e Espanha. Se já é difícil lidar com judeus, imagine com judeus que são espanhóis. Que inferno…

A guia turística lá prosseguiu a sua prelecção sobre os acontecimentos da guerra, o sítio onde as bombas caíram e o espectáculo que foram os croatas, tanto os que se defenderam do inimigo com facas de cozinha, fisgas, inoculadores de asma e borrifadores de Ajax multisuperfícies, mas também os que depois reconstruíram a cidade antiga tal-e-qual como ela era, de maneira que hoje está tudo intacto, lindo, impecável, perfeito para agradar aos senhores da UNESCO. Fico tão impressionado com a reconstrução que:
1) desconfio que não houve guerra nenhuma e alguém me está a tentar enganar;
2) o governo grego devia fazer uma visitinha a estes senhores para perceber como pode ter as obras de restauro do Parthénon prontas antes da vindima;


Uma das formas mais divertidas e originais que os dubrovniquianos (ou dubrovniquenses? Ou dubrovnicos, simplesmente?) encontraram para colorir o processo de reconstrução da cidade foi pintar símbolos do Hajduk Split por todo o lado. O quartel dos bombeiros tem um (gigante), o posto dos correios também e as casinhas que servem de albergue às caixas ATM têm vermelho aos quadradinhos e faixas azul-e-vermelho a identificar a tal «Torcida». Cheguei a pensar que o Hajduk Split era, também, uma cadeia de bancos.

Vale a pena vir a Dubrovnik e ficar por aqui. Engolir golfadas de ar puro e gastar os olhos com o reflexo do sol nas águas do Adriático. Mergulhar os braços e apanhar ouriços-do-mar. Comer um gelado na esplanada do centro histórico, enquanto pensamos por que raio a porta de entrada se chamará «Pila». Não existem charretes como em Sintra, mas, vendo pelo lado positivo, não precisamos de trazer a gabardine nem andar sempre a olhar para o chão para evitar pisar cocó.
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Wednesday, April 08, 2009

Eu cá gosto quando me servem uma cerveja que é mais alta que a Carolina Patrocínio

Munique é aquela cidade famosa na Alemanha.

Famosa por causa daquele clube que tem uma estranha predilecção de esmagar os clubes de futebol de Lisboa com festivais de golos (sim, sim, ou os benfiquistas têm memória curta e esquecem-se que também já sucumbiram aos pés do «Kataklinsmann»?), famosa por ter a sede de uma das marcas de automóveis preferidas dos construtores civis e famosa por ter uns santos populares em Outubro em que dezenas de canecas de cerveja se enfiam teimosamente em generosos braços de senhoras de tranças e bigodes maiores que o meu.

Infelizmente, Munique é também uma cidade famosa por estar cheia de alemães. Isto até podia nem ser um problema, se os alemães cheirassem bem, se não tivessem a desagradável tentação de comprar as roupas com as cores mais bizarras que encontram e se falassem uma língua minimamente compreensível. O meu conhecimento do idioma deles é limitado. De resto, o meu conhecimento de qualquer idioma que seja é limitado a um nível próximo da inutilidade. Estas palavras só estão neste blogue porque me emprestaram uma máquina que converte aquilo que eu grunho em palavras escritas. E, mesmo assim, de quinze em quinze segundos dá um apito irritante e diz: [imaginar voz de robot] «beeeeeeepppp! essa palavra não existe!» [parar de imaginar voz de robot]

O que eu sei de língua alemã chega para muito pouco: «guten morgen», para dar a ideia que estou feliz porque está uma linda manhã, mesmo quando é de noite; «danke schön», para parecer educado e inteligente; «auf wiedersehen», que uso com frequência sempre que pressinto que vou conseguir sair rapidamente daquele país; e «eine bier, bitte», a expressão mais importante de todas, que quando corre bem tem como resultado prático porem-me uma cerveja à frente dos beiços. Da última vez que usei esta frase fiquei extraordinariamente feliz: primeiro, porque a menina a quem eu pedi a cerveja - que parecia o maestro Vitorino de Almeida vestido de padeira austríaca - percebeu à primeira e até sorriu; e, segundo, porque esta foi a primeira vez em 7432 idas a Munique em que não estava a chover torrencialmente ou a nevar. E olhem que eu já tentei ir em Agosto e, mesmo assim, choveu durante 72 horas. Ininterruptamente.

Eis que chega, então, uma cerveja. Fresquíssima, com borbulhas lindas, com um grande bigode de espuma e muito loira. Parecia quase a Marisa Cruz. E parecia, sobretudo, porque era grande, muito grande. E estava dentro do maior copo de imperial que eu já vi na vida. Uma cerveja que, na sua esplendorosa totalidade, era mais alta que a Carolina Patrocínio*. Fantástico. Era mesmo o que me estava a apetecer, porque, na verdade, não há mais nada de jeito para fazer em Munique.

* - é que eu já estive ao lado da Carolina Patrocíno. Quer dizer... disseram-me que tinha estado ao lado dela. É que eu espreitei, espreitei, olhei para baixo, mas ela é tão pequenina que ficou tapada pelos meus joelhos. Mas dizem que tem um rabinho, ui, ui...

Quando me disseram que alguém estava a combinar uma visita ao centro histórico da cidade, acompanhado de guia turístico, torci o nariz. Torci o nariz, porque nesse momento estava a tentar enfiar toda a minha cabeça biónica dentro do copo de cerveja e o meu nariz, que é feito numa mistura de carbono e kevlar, estava todo torto. E depois porque não me parecia uma boa ideia trocar as melhores loiras que eu já vi na vida por um passeio numa cidade alemã. Todavia, sob a ameaça de divulgação às autoridades da minha posição geográfica no planeta** e a ameaça de porrada, lá tive que engolir a pilsner à pressa e ir com o resto da manada.

** - para quem não sabe, eu ando foragido à justiça desde que roubei uma arca com beringelas de ouro maciço em Vanuatu. Fui interceptado quando tentava trocá-las por discos do António Variações na casa do Benfica do Luxemburgo, mas consegui fugir pela porta dos fundos com a conivência do polícia de serviço, que foi meu companheiro de beliche durante a invasão de Samarkanda.

À frente de uma guia turística juntou-se um numeroso grupo de pessoas. Dois americanos, uma dinamarquesa, cento-e-oitenta-e-três japoneses e uns dois ou três espanhóis. Os espanhóis perderam-se ao final de duas esquinas, felizmente. Os japoneses fizeram o trajecto todo, infelizmente. A guia turística era uma simpatia e falava inglês. Tinha uma voz quase tão irritante como a daquela moça que apresenta um programa de TV com o Goucha, mas era, na verdade, muito simpática. Tinha uns óculos que a faziam ter um ar inteligente. Unhas pintadas, bem arranjadas. Camisa de seda impecavelmente passada. Manchas de suor nos sovacos como se fosse o Camacho. No fim, recebeu palmas dos japoneses e ficou emocionada. Ao meu lado estava uma japonesa que não parava de rir. Formosa, fofa. Com sorriso singelo, fofo. Tinha um cabelo preto, longo, bonito, fofo. Afinal, era um japonês. Fofo.

Um dos pontos altos da visita guiada à cidade é ficar uns minutos - algures entre dois e três minutos, o que para mim é uma eternidade - à frente do edifício da antiga catedral à espera que bata as quatro da tarde para se ver um espectáculo inolvidável. Uns bonequinhos mais ou menos apessoados andam para a frente e para trás, batem com as canecas umas nas outras e fingem que estão a dançar, ao som de uma cacofónica melodia dos sinos. Miserável espectáculo e milhares de pessoas a ver. E a bater palmas. Quer dizer, os japoneses batiam palmas. A tudo, basicamente.

Uma das japonesas sentiu-se mal e deu-lhe assim um fanico tipo desmaio. A guia turística, acompanhada da sua voz perturbante para qualquer sistema nervoso, acudiu, abanou uma tímida brisa de ar com a mão direita e exclamou «desculpem! É que estamos a atravessar uma vaga de calor!». Amiga... olha bem para mim: estou de casaco e cachecol. Não calcei as luvas por vergonha, mas fiz questão de colocar dois pares de meias entre os pés e os sapatos. Estão 11 graus. Em nenhum lugar do mundo com excepção da Gronelândia, do Alasca e da Serra de Sintra esta temperatura se qualificaria como «vaga de calor». E no entanto, os muniquenses (ou serão «municos»? ou «muníacos»? ou «muniscos»?) andam na rua como se alguém tivesse rebocado o calor das Bahamas até ao sul da Alemanha. Como quase toda a gente anda de bicicleta, é ver os rapazes de calção e chinela, as meninas de mini-saia e tops com quase tudo de fora, os rapazes que são meninas também de top mas numas cores assim rosa-choc e verde fluorescente e flores no cabelo e fitas com arco-íris e tudo muito gay, muito gay.

O melhor de Munique foi o que descobri, sem querer, enquanto andava perdido a tentar encontrar o Schweinsteigger para lhe dar com uma cadeira no focinho. A uma meia hora de caminho do centro de Munique (45 minutos, se for um Fiat, uma hora e dez, se for de pasteleira, duas horas e meia, se for a pé) fica um memorial. Mais concretamente, um memorial sobre o Holocausto, feito a partir do campo de concentração de Dachau. Isto é, o campo de concentração propriamente dito, transformado num museu, que todos podem visitar. Eu decidi visitar e, como bom parvo que sou, entrei cheio de moral e a fazer piadinhas parvas sobre judeus, férias e hotéis de cinco estrelas. Bastaram cinco minutos lá dentro para perder a vontade de rir e 40 minutos de visita, com passagem pelas câmaras de gás (que foram mantidas intactas, mas sem bicos de gás), para ficar mais enjoado do que se tivesse comido favas à transmontana.

Peço desculpa pelo teor sério destas últimas linhas, mas é que aquele sítio impressiona mesmo. Demorei uns quatro minutos a recompor-me. O memorial de Dachau é a prova de que os alemães, apesar de tudo, não têm vergonha do passado, pelo menos não o suficiente para se esconderem e assobiarem para o lado a fingir que não foi nada com eles. Também não têm orgulho nisso e, sempre que podem, evitam falar no Holocausto. Mas sabem o que os antepassados andaram a fazer e alguns deles lamentam que tenha sido assim.

Só por causa disso, tiro-lhes o meu chapéu. Mas a seguir ponho-o logo na cabeça outra vez, que está frio...
o

Para o improvável caso de alguém querer saber as coisas parvas que por aqui se dizem...

Coisas que se dizem assim por aí...

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